quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Do pó viemos e ao pó voltaremos



Tinha gastado meu último tostão na pedra, estava duro, sem dinheiro para o cigarro, meu vício, vontade, instiga, seja lá como preferir estava me matando.
Havia algum tempo que eu tinha voltado da cidade grande, eu era um filho de um homem do campo, tinha ido estudar, e por fim aprendi coisas demais nessa mudança. Tinha que dar um jeito, tinha que fumar a minha pedra!
Andei pela casa olhando em todos os cantos, chegando à sala, uma ânfora, branca com flores azuis, lírios, tentando dar um toque de alegria àquele objeto fúnebre. Dentro dela, as cinzas de meu avô, pobre homem. Eu tremia, mais parecia que tinha Parkinson. Peguei um punhado, pus em cima da minha lata já previamente preparada, latinha de Fanta uva, alguém a jogou na calçada. Coloquei a pedra em cima, me agachei no chão, e risquei o isqueiro. Dei à primeira "bola", prensei, joguei tudo pra mente, fiquei em êxtase durante os segundos que eu prenso a fumaça, soltei-a e volta a bater a crise, derreto tudo sobre o alumínio. Até que acaba, o cérebro reage de forma agressiva. Eu ansiava mais!
Busquei pela casa, revirei os cômodos "onde? onde tinha mais?", "onde tem dinheiro pra eu comprar mais?”.
Fui à cozinha e pego uma faca no balcão da pia. Chutei desesperadamente a porta do quarto dos meus pais. Esfaqueei o meu pai enquanto ele dormia, e eu gritava feito louco:
"Me dá dinheiro filho da puta!"
Minha mãe saltou da cama repentinamente com os olhos arregalados, olhou-me por alguns segundos também antes de eu enfiar-lhe a faca seis vezes na garganta, retalhou o que tinha de carne em seu pescoço fazendo jorrar sangue a 2 metros de altura. Os policiais ficaram horrorizados com o estado que ficou o rosto dela também. O quadro na parede sobre a cabeceira da cama ficou manchado de escarlate. Os anjos do referido pareciam estar chorando sangue, ou que tinham acabado de sair de um matadouro, havia sangue escorrendo em suas faces.
Com a gritaria meu irmão menor acordou, ficou assustado e atordoado com os gritos de seus protetores, fui ao seu encontro no quarto, pobre criança, meros sete anos de idade. Passei a faca lenta e friamente em um movimento retilíneo que foi da boca à proximidade dos seus miúdos olhos, devagar, sem feri-lo, somente para sentir a sua carne tenra na ponta da faca.
Quanto mais eu me aproximava dos olhos, mais eles se abriam sinal do horror na criança,
Desci novamente, bem lentamente, cheguei até a boca, lábios finos e rosados. Bati com a faca em seus dentes, ele havia perdido há poucos dias os incisivos superiores, fui introduzindo a faca em sua boca, sem o mínimo sinal de compaixão, o fio afiado não encontrou dificuldades pra ir cortando a sua gengiva, eu via o terror em sua expressão, e ele foi tentar gritar, pobre infeliz, num ato desesperador de pedir socorro, mal o sabia, que a sua pequena língua empurraria mais ainda a lâmina, cravando-lhe na gengiva e saindo mais sangue.
Aquela mistura sublime e infernal do grito e choro de criança, com saliva, sangue e lágrimas.
Puxei a faca um pouco para fora, virei-a e abri a sua bochecha, aquele zunido vocal agudo, contínuo e desesperado, o ar agora saía pelo corte, e eu podia ver seus molares ensanguentados logo abaixo de seus olhos, a carne de sua maçã-do-rosto tremia a cada suspiro. Dei-lhe um soco no olho, próximo ao corte, nesse momento a endorfina, anestésico natural do corpo, já deveria estar agindo fazendo-o não sentir tanta dor, porém minha força é maior e o pirralho desmaiou.
Saí do quarto, arrastei uma mesa que estava jogada na garagem para a rua.
Acendi umas velas, pretas e vermelhas, e preparo um altar.
Voltei pra buscar o pivete, forcei a porta e estava trancada.
Não é que o desgraçado tentou me enganar?
Eu batia na porta e gritava "Abre isso daqui seu filho da puta! Eu vou te matar desgraçado!”.
Eu ouvia o choro da criança clamando por sua mãe, o soluçar, eu podia sentir o medo do outro lado da porta.
Comecei então a chutar a porta, meu irmão preso no quarto ficava ainda mais em desespero.
Fiz silêncio, o soluçar dele ficou mais baixo.
Eu ainda o ouvia soluçar, morávamos em um sítio, o silêncio predominava nas noites.
O surpreendi jogando uma pedra na janela, os estilhaços saltaram em seu rosto e ele correu pra debaixo da cama.
Puxei-o pela perna enquanto ele tentava ainda rastejar para o refúgio ineficiente.
Aquele exato momento em que ele me olhou, se eu pudesse parar o tempo e descrevê-lo.
O olhar daquela criança com cacos de vidro grudados em sua face, com destaque a dois presos nas pálpebras, deveria ter um centímetro cada, e refletia a luz da lua neles.
Eu sentia a tensão como se fosse o predador e a presa, naquela fração de segundo, eu senti que sua expressão clamava por misericórdia, a inocência e o instinto de sobrevivência.
Tão logo que o puxei pela perna já cortei o seu tendão-de-Aquiles, no impulso ele ainda conseguiu ficar de pé, somente sobre uma perna. Com meu ímpeto cruel cortei logo o outro fazendo aquele pequeno corpo cair ao chão. Ao cair com o queixo naquele assoalho de madeira ele tentou continuar rastejando. Maldito! Rastejava feito um verme tentando escapar da morte inevitável. Prontamente enfiei a faca em seu ombro, fiz um corte transversal que deixou o osso exposto. Calculoso
repeti o processo no outro ombro, fazendo com que o desgraçado não fugisse mais.
Mas a lição eu tinha guardado ainda. Eu iria ensinar ele a nunca mais fugir de mim, agora ele iria me obedecer e ter bons modos. Virei ele de barriga para cima e cortei os nervos das dobras do braço e do pulso. Pus a ponta da faca em seu pescoço, novamente sem machucá-lo e com um golpe de fúria rasguei a parte de cima do pijama da criança, branco com ursos marrons, alguns ainda apareciam, outros o sangue já cobria deixando àquela vestimenta tão inocente e infantil um toque macabro e violento. Desci e cheguei com a faca em seu umbigo, eu estava adorando tudo aquilo, fui próximo a sua pélvis e enfiei a faca, rompo com a lâmina as terminações nervosas da perna, ali, ensanguentado e impotente ele não fugiria mais de mim. Criança desgraçada, não parava de gritar.
Fui à garagem e achei o que eu queria. Meu falecido pai tinha agulha e linha pra suturação guardadas em um armário, ocasionalmente ele usava para algum animal que se feria. Agora sim ele iria calar a boca!
Voltei ao quarto, ponho a linha na agulha, vou costurando calmamente a boca do meu irmão enquanto eu ainda cantava “Bonde da Mutilação”, a doce canção da UDR era como um réquiem sarcástico. Eu via a ponta da agulha furar o lábio deixando uma linha de rastro por onde ela passava, atentamente dei o nó para não abrir a costura, aquele desgraçado já não ia gritar mais. Estirado no chão, fui puxando ele pelos cabelos castanhos até a sala, ele inerte, sem poder pedir ajuda, com as pálpebras sangrando, havia sangue seco por toda a face, mas ainda saía o líquido vital de onde eu tinha feito a suturação.
Voltei ao quarto dos meus pais, vi o massacre que eu causei o rosto desfigurado de minha mãe e o peito todo perfurado de meu pai. Sangrou como um porco!
Arrastei os dois para fora, e coloquei-os sobre o altar preparado.
Voltei na garagem, peguei uns pregos e o martelo, fui à cozinha e peguei uma vasilha, então retornei a sala onde meu irmão me esperava. Coloquei-o sentado na poltrona, e para que dali não saísse preguei-o ali, comecei pelos dedos, pregando-os nos braços da poltrona, na verdade, preguei até os ombros dele. Depois peguei a faca, furei o coração dele e aparei todo o sangue com a vasilha, ou o que restava, acabava de ser imolado para o meu ritual. Fui para a rua e voltei ao altar e coloquei os corpos dos meus pais sobre ele, os corpos um sobre o outro, enquanto eu orava: “Apo Pantoz Kakodaimonoz”, banhei meu punhal no sangue do meu irmão e pus a vasilha sobre o altar improvisado “Apo Pantoz Kakodaimonoz” e faço uma cruz invertida na minha testa com o punhal.
Sim, eu preparei pra você, o sangue de um jovem puro e inocente, morreu sabendo o que é o medo. Bebi o sangue e ungi minha cabeça. Ateei fogo no corpo dos meus pais sobre o altar e os vi queimar diante dos meus olhos. As chamas crepitando e eu vendo o gordura derreter, o cheiro de carne assada que adentrava minhas narinas, e aquela velha mesa de jacarandá queimando lentamente, me sentindo lisonjeado de que o meu Senhor proporcionou-me tal cena, sentia-me um sádico, estava tendo prazer em ver tudo aquilo. Peguei a cinza dos meus pais e guardei-as em um pequeno pote, assim da próxima vez que eu fumasse eu teria cinza já. Fiquei observando até os policiais chegarem pela manhã, queria ter visto a hora em que abriram a porta e se depararam com o meu irmão morto, tinha deixado ele propositalmente na sala virado para a porta de entrada da casa, devem ter sentido terror do massacre, a energia negativa no ar.
A partir desse dia, as pedras que eu fumo tem sabor de morte. Foram dez reais de pedra, cinzas mortuárias e uma matança desenfreada.


Ps: Primeira postagem de 2014, pra tirar as teias